Então o que você planta?

Sandy mora em um apartamento tão pequeno que, quando chega do supermercado, tem de decidir o que pôr para fora a fim de abrir lugar para suas compras. Ela luta dia a dia para alimentar e vestir a si mesma e sua filha de quatro anos, com o dinheiro de trabalhos literários autônomos e de bicos.

As coisas que a maioria das pessoas, considera essenciais para sobrevivência, televisão, forno de micro-ondas, aparelho de som e tênis caros, estão lá embaixo na lista de “talvez algum dia” de Sandy.

Sandy bateu em mais portas do que pode lembrar, tentando conseguir um emprego decente, mas sempre existe algo que não encaixa perfeitamente – experiência insuficiente ou do tipo errado, ou horários que tornam impossível tomar conta de uma criança.

A história de Sandy, não é incomum, muitos pais e mães solteiras e pessoas idosas, lutam com nossa estrutura econômica, caindo naquele espaço ambíguo que existe entre ser realmente autossuficiente e ser suficientemente pobre para receber ajuda do governo ou alguma entidade.

O que torna Sandy incomum, é seu ponto de vista:
– Não possuo muito no sentido de ter coisas, contou-me com um sorriso sincero.
– Isso a incomoda? – perguntei.
– Às vezes, quando vejo outra menina com uma idade próxima à de minha filha, que tem roupas bonitas e brinquedos bons, ou que está andando num carro chique ou morando numa bela casa, me sinto mal. Todo mundo quer ser bem sucedido para seus filhos. – respondeu
– Mas você não se amargura?

– Ficar amargurada com o quê? Não estamos passando fome ou frio e tenho o que realmente importa na vida – replicou.
– E o que é isso? – indaguei.
– Do meu ponto de vista não importa quantas coisas você compre, não interessa quanto dinheiro ganhe, você só fica com três coisas na vida, que ninguém pode tomar de você: primeiro, as suas experiências, segundo, seus amigos verdadeiros e terceiro, aquilo que você planta dentro de si mesmo – ela respondeu sem hesitar.

Para Sandy as experiências são acontecimentos comuns de sua vida com a filha. Sua definição de amigos:
– Os amigos verdadeiros são aqueles que nunca saem do coração, mesmo que saiam de sua vida durante algum tempo.

Quanto ao que plantamos dentro de nós, disse:
– Isso cabe a cada um de nós, não é? Não planto amargura nem arrependimento, poderia se quisesse, mas prefiro não fazê-lo.
– Então o que você planta?

Olhando carinhosamente para a filha, e, depois para mim, apontou para seus próprios olhos, que estavam iluminados de ternura, gratidão e um brilho de felicidade.

Comentários