No meu tempo

Nós nascemos antes da penicilina, da Vacina Sabin, da comida congelada, da fralda descartável, do Modess, do OB, das creches, das lentes de contato, da pílula anticoncepcional, do Viagra e do Lexotan. Nascemos antes do plástico, do radar, do Xerox, do motor a jato, do videocassete, do computador, do telefone celular e do raio laser.

Nós nascemos antes do cartão de crédito, da esferográfica, das lavadoras de roupas, das máquinas de lavar pratos, dos cobertores elétricos, do freezer e do micro-ondas.
Antigamente a lua era conhecida somente por seresteiros, poetas, namorados e nela habitava São Jorge.

Não havia parabólicas, nem TV a cabo. Xuxas, Sashas, Faustões, Angélicas e Gugús também não existiam. Ratinho era parceiro de Jararaca, tocava saxofone e fazia um humor saudável. Nós nascemos antes dos direitos dos Gays, dos homens de brinquinho, da mulher com dupla jornada de trabalho. antes das produções independentes, dos bebês de proveta, da ovelha Dolly, dos filhos de berçários, da terapia de grupo, dos Spas, dos Flats e dos carros a álcool.

Carequinha ensinava que o bom menino não faz xixi na cama. para dormir a mamãe cantava o “boi da cara preta”, quando fazíamos travessuras mamãe nos metia medo do bicho papão. nunca nos esquecíamos de pedir a “benção” antes de sairmos de casa para o colégio. Aos domingos, nos reuníamos para o almoço na casa da vovó, vovô sentado à cabeceira da mesa, dizia tudo com simples olhares.
No nosso tempo, tínhamos medo da tuberculose, da gonorreia e da sífilis, a AIDS não existia e desconfiávamos que homossexualismo era coisa de francês. Acho que a nossa geração era mais escorregadia. para nascermos bastava uma ajudazinha de uma parteira curiosa. As dores de dente eram aliviadas com a cera do Dr. Lustosa. para fraqueza, Emulsão de Scott. para bronquite, Rum Creosotado.

Quem poderia esquecer, se toda manhã ao tomarmos o bonde, lá estava escrito: “veja ilustre passageiro, o belo tipo faceiro…”
Antigamente nós casávamos primeiro e só depois morávamos juntos. Como éramos estranhos, não?
Nunca ouvimos falar de inputs, cdroom, multimídia, fax-modem, fibra ótica e vídeo game. nós jogávamos bibloquê, pião e bola de gude. soltávamos pipa e apanhávamos balão, brincávamos de casinha, comidinha, pique esconde, roda, passaraio, garrafão, bandeira, carniça, bento que bento é o frade e, calçadinha é minha.

Que mundo era o nosso, heim?
No nosso tempo os homens fumavam cigarros. erva era usada para fazer chá e coca era refrigerante. pó era sujeira, sangria era para evitar colapso, lambada era chicotada, malhar era coisa de ferreiro, fio dental servia para limpeza dos dentes e embalos faziam crianças dormir. Isso nos bastava e éramos felizes com o que tínhamos. Nossos ídolos eram o Diamante Negro, com seus gols de bicicleta. As emoções no futebol vinham pela voz de Gagliano Neto, e, nos Fla x Flus, por conta dos choros e da gatinha de Ary Barroso.

Novelas? Nada de Selva de Pedra, Terra Nostra, nem Torre de Babel. Vivíamos todas as semanas as emoções de “Em busca da felicidade”, nos encantando com as vozes de Paulo Gracindo e Ismênia dos Santos. “Quem sabe o mal que se esconde nos corações humanos…só o Sombra sabe”, era o que nos dizia Saint Clair Lopes. No nosso tempo, nada de Plim-Plim. Tínhamos a Pequena Notável, o Rei da Voz, o Caboclinho Querido e o Cantor das Multidões.

Nós fomos a última geração, a tal ponto ingênua, que pensávamos que se precisava de um marido para se ter um bebê. Não é de se espantar que sejamos tão confusos e que haja tamanha lacuna entre as gerações.
Nós vivemos o ontem, estamos vivendo o hoje e continuaremos a viver o amanhã. Apesar de toda e qualquer invenção que a inteligência humana possa criar. Querem saber por quê?

Qual o segredo que esta velha geração guarda bem no fundo de seu coração? É que ela tem dentro de si uma força imensa que não é invenção dos homens, nem privilégios de novos tempos: – o amor, a crença nela mesma e a imensa fé em Deus.

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