Uma vida real

Há mais de um século na cidade de Cincinnati, nos Estados Unidos, um juiz de direito acompanhou, discretamente, uma verdadeira demonstração de perseverança, observando certas atitudes pacientes e persistentes de um menino. Tudo aconteceu quando o magistrado procurava, numa grande livraria, uma obra de interesse profissional e viu chegar ali um menino com forte evidência de profunda pobreza, desejando adquirir um livro de geografia.

Informado do preço, o menino pôs-se a contar suas moedas que, juntas, somavam apenas a metade do valor. Consultando o vendedor sobre a possibilidade de um pagamento parcelado, teve uma resposta negativa e então foi saindo desapontado. Nisto, o juiz lhe perguntou:

– E agora?

– Vou procurar em outra livraria – respondeu o menino, com naturalidade.

– Posso acompanhá-lo? Gostaria de saber se conseguirá – falou o juiz.

– Pois não, se o senhor quiser, podemos seguir juntos.

Entraram em várias livrarias e sempre recusavam vender-lhe o livro, porque o seu dinheiro estava incompleto. Afinal, depois de muito caminharem, entraram em outra livraria. O garoto, corajosamente, explicou sobre o que desejava, falou da importância do livro para ele e disse também que não possuía todo o dinheiro necessário.
O dono da livraria, tão amável e paciente, ouviu tudo a respeito
das razões do menino:

– Por ter de trabalhar eu não posso frequentar a escola, mas posso estudar sozinho. Quero muito aprender geografia porque meu pai, enquanto viveu, foi marinheiro e eu também desejo ser quando for adulto. mas para isto preciso estudar muitas coisas, inclusive saber geografia muito bem.

Encantado com as convicções do garoto, o livreiro embrulhou o livro, deu-lhe caderno, lápis e outros materiais só pela importância que ele tinha em mãos. O juiz, que até aquele momento só acompanhara a perseverança do menino, entregou-lhe uma razoável importância em dinheiro, para que ele pudesse adquirir outros livros.

– Muito obrigado a ambos – disse o garoto. – Os senhores foram muito generosos comigo. Espero ser-lhes útil um dia. O meu nome é Guilherme Haverli.

Trinta anos mais tarde, aquele juiz viajava para a Europa em um dos maiores navios da época. Ao se aproximar da Inglaterra, bateu uma violenta tempestade. A tripulação, em pânico, quis lançar mão dos salva-vidas, na tentativa de assim se salvar.

O capitão, entretanto, não permitiu que se arriscassem. Sabia que com coragem e ação poderiam aportar em segurança. Os passageiros, então, se revezaram, ajudando a retirar a água que entrava até ancorarem. Ao deixar o navio, o juiz cumprimentou o capitão que, vendo-o, revelou de imediato a sua identidade:

“Sou Guilherme Haverli. Que Deus o recompense pelo bem que me fez naquela ocasião. Espero ter-lhe sido útil nesta oportunidade.”

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